a estação espacial

estou sentado em uma cadeira no quarto.
o meu pai abre a porta
(olho para ele)
gostaria que eu
o seguisse.
(eu estava ocupado.
mas me levanto.)
vamos até o quintal da frente e lá meu
pai apaga as luzes
e aponta para o céu.

– o que será aquilo?

– vênus – pergunto,
sem saber que não poderia ser isso.

uma pausa.

– não, tá brilhando demais
pra ser algum planeta ou
estrela, e se mexe
muito rápido.
pode ser
a estação espacial.
ela dá 16 voltas na terra
todo dia e dá pra ver daqui – ele diz. não sei se o dado está certo.

– pode ser um cometa – replico com esperanças:
jamais vi um cometa.

mas não tivemos como descobrir.
seguimos,
astronomicamente ignorantes,
lançando adivinhas
ao céu do rio de janeiro.

talvez todo dia seja construído
a partir de uma única e feroz
sutileza:
e daí pra cima, por camadas opacas,
até a banalidade de trancar o portão
esperar o ônibus e comprar um pastel de queijo.
pense nesse pontinho
cintilando absurdo – escondido
acima de uma metrópole de 7 milhões de pessoas
e zunidos

plumas

existem flechas correndo
dentro de minhas veias.

sim: flechas pontiagudas,
largas cabeças de ferro fundido.

nenhuma está aqui
para rasgar

a minha carne.
eu não permitiria.

apesar de que, por carregar
essas flechas,

reconheço ter o potencial
destrutivo

de um guerreiro samurai
em tardes iminentes.

no fim, isso
pode importar muito pouco:

se essa não é
sua intenção.

seu gesto corriqueiro
é de outro temperamento. seguem incontestáveis

em ciclos no plasma vermelho
até que

acertam num impacto o centro
do meu corpo.

e delas só restam umas poucas
plumas

que precipitam
com súbita leveza.