habitado

não existe um bicho apenas
dentro de mim. é em quantidade
suficiente para dar conta de festa & fome
que sou habitado – atravessado. entre chão
e o que chamamos de mistério: plumas, patas,
rastro. engana-se quem pensa o contrário.

não concordo que alguém me pense
somente uma árvore, um único arbusto.
é também de cipó os meus braços, enroscando-se
no que vive: com força, apego de jiboia ao mundo
que é terra. e também a lâmina mais irreverente
da grama rasteira sou eu: invisível e viva, verde
junto ao verde, todas elas juntas.
e o vento que me alisa.

quando falo, tampouco acredito serem
minhas as palavras que digo. engana-se
quem pensa que basta uma pessoa para
movimentar um corpo uma língua. se escutar com
atenção, verá como foi preciso, para a manifestação
mais simples, que cada voz esbarrasse na outra
& na outra & na outra & na outra & na outra &

um pouco tarde

Depois de a
muitas custas
aceitar que
você é onde
meu corpo
cisma estou
agora
à procura
de responder:
quando afinal
é que se
ama quem
se quer (
ou quando
se pode
enfim perder
-se em quem
se ama) e
quem foi
mesmo que
disse que não
pode ser
agora (e
nem sequer
amanhã
no mais
tardar pode
ser) quando
até
se fosse pra
ontem
seria ainda
um pouco
tarde
?